26/07/2022

Posso usar um filtro simples no tratamento de água?

Em geral, para o tratamento de água, costumamos pensar que um filtro qualquer basta para bebê-la.

Tecnicamente essa água em condições de consumir chamamos de “potável”. Mas a final, o que é importante para podermos consumi-la?

Três coisas são importantes para se obter água potável a partir de qualquer fonte:

  • Filtrar partículas até 1 mícron (0,001 milímetros), que é uma etapa física
  • Reter compostos químicos perigosos, sendo uma etapa química
  • Inativar ou eliminar patógenos, que trata-se de atacar a parte biológica

É importante salientar que, dependendo da fonte, essas três coisas tem suas variantes, que podem exigir um sistema simples de tratamento ou até mesmo um bastante complexo.

Vamos entender melhor cada um desses itens.

Antes de entender o primeiro item, vamos esclarecer o que é 1 mícron. É o tamanho correspondente a um milésimo do milímetro, ou seja, para compreender melhor, em grandeza corresponde à espessura de uma teia de aranha. Então, a filtração de partículas até 1 mícron é o processo físico de retirar da água partículas suspensas que possuem até esse tamanho. São partículas como poeiras, ácaros, pelos, algumas bactérias maiores, entre outros exemplos. Para isso, usamos um filtro que pode ser de areia, ou de cartucho, ou ainda aquele filtro de barro muito conhecido, que, aliás, é uma excelente opção para residências. Mas se utilizarmos só um filtro de areia ou mesmo de cartucho, e conseguir reter essas pequenas partículas, o que restará na água?

Restarão ainda partículas suspensas menores do que 1 mícron, além de partículas dissolvidas, que podem ou não fazer mal à saúde, dependendo do que elas são. Vamos entender de forma simples a diferença entre partículas suspensas e dissolvidas. Partículas suspensas são aquelas que proporcionam turbidez à água, isso quer dizer que quando alguém apenas de olhar e perceber que ela está suja, refere-se a partículas em suspensão que estão presentes naquela água, dando um aspecto visual de estar “suja”. Já quando você olha uma água mineral, por exemplo, ou uma água proveniente de poço artesiano que visualmente está límpida, significa não há sólidos em suspensão (ou, pelo menos, numa quantidade razoavelmente pequena), mas com certeza há partículas dissolvidas, tanto na água mineral quanto na do poço artesiano.

Isso não significa necessariamente que se tem algo dissolvido na água que faz mal à saúde. Na verdade, mesmo na água potável é necessário que se tenha alguns sais dissolvidos na água, como sódio, cálcio, magnésio, cloreto, fluoreto, entre outros. O problema real em relação à saúde não é propriamente a existência de compostos químicos dissolvidos, mas sim a quantidade de cada um desses compostos presentes na água. Por exemplo, a presença de ferro dissolvido na água é aceitável se este estiver a uma concentração abaixo de 0,3 miligramas por litro (em referência à Portaria 888 do Ministério da Saúde). Mas se o ferro estiver numa concentração, por exemplo, de 3,0 miligramas por litro, ele confere um risco à saúde, e então deve ser removido para se obter uma água para consumo.

Isso nos leva à segunda coisa importante no tratamento de água, que é remover os compostos químicos perigosos. E como vimos, um composto perigoso depende da quantidade (concentração) em que ele está presente, e não necessariamente apenas dele estar ali. Sendo assim, após remover as partículas suspensas até 1 mícron, temos que atacar os compostos que ali restam que estão presentes em concentrações acima do limite que confere risco à saúde. Para isso, é necessário então saber quais compostos químicos estão presentes na água e em quais concentrações, ou seja, torna-se necessário realizar uma análise. Através desta, saberemos quais parâmetros devemos remover (ou reduzir abaixo da concentração limite). Esses parâmetros estão descritos na Portaria 888 do Ministério da Saúde, tanto quanto a concentração aceitável de cada um deles. E para cada um desses compostos, existe um método ou tecnologia disponível no mercado, mas de uma forma geral são conhecidos como processos de adsorção química. A adsorção química basicamente é quando passamos a água através de um filtro composto por um meio que possui afinidade química ao composto perigoso, e então ao passar a água, esse meio “segura” para ele o composto que está em concentração “perigosa” reduzindo a uma concentração aceitável pra fins de consumo. Em outro artigo, podemos abordar sobre quais são as tecnologias disponíveis para cada tipo de composto.

Após remover partículas suspensas e também reduzir compostos em concentração perigosa até à quantidade aceitável, o que resta? Resta então eliminar eventuais organismos patogênicos presentes na água, ou seja, pequenos micro-organismos vivos como bactérias, vírus, protozoários e helmintos, que podem apresentar risco à saúde. Esses pequenos seres podem ser facilmente eliminados por um processo conhecido como oxidação química, que nada mais é do que realizar a desinfecção da água através da adição de um produto químico para destruir esses micro-organismos patogênicos. Para isso, são utilizados produtos como por exemplo cloro, peróxido de hidrogênio (água oxigenada), ozônio, ou ainda aplicação de luz ultravioleta.

Apesar de serem conceitos bem simples para se obter água potável, conforme mencionei no início, dependendo da fonte é necessário alguns complementos aos processos citados acima, como por exemplo, se a água bruta for mais turva (turbidez acima de 50 NTU) passá-la diretamente em um filtro de areia ou cartucho causaria um entupimento precoce deste, além de muita perda de água para retrolavagem do filtro ou gastos com troca do meio filtrante. Então, é necessário um processo prévio para remoção do material em suspensão presente em maior quantidade na água, que lhe confere elevada turbidez. Este processo é denominado de floco-coagulação, que é realizado através da dosagem de produtos químicos para coagulação e floculação dos sólidos em suspensão presentes na água e posterior decantação ou sedimentação, para após remoção desse material mais “pesado”, com uma água menos turva (mas ainda com pouco de material suspenso) passar pelo filtro com o objetivo de reter então as partículas até 1 mícron. Além disso, existe a possibilidade também da água suja conter material orgânico dissolvido, tornando o tratamento ainda mais complexo, e podendo necessitar de um processo biológico ou de membranas mais sofisticadas de filtração (micro, ultra ou nano filtração), dependendo da concentração desses compostos orgânicos dissolvidos.

Sendo assim, a escolha do melhor sistema para tratamento da água requer uma análise minuciosa por parte de quem irá projetar ou executar o tratamento, envolvendo todos os aspectos para conhecer a fonte da água bruta e suas características, e poder escolher as melhores tecnologias aplicadas a fim de se obter água potável e garantir saúde ao consumidor.

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